Notícias
Justiça do Paraná condena homem por ofensas homofóbicas e violência psicológica contra ex-companheira

A Justiça do Paraná condenou um homem a pagar indenização por danos morais à ex-companheira, após ela relatar agressões verbais e ofensas homofóbicas constantes. A decisão é da 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná – TJPR, que reformou a sentença da Vara de Família e Sucessões de Paranavaí.
Segundo informações do TJPR, o caso envolve um casal que tem um filho em comum. Após o fim do relacionamento, o homem passou a ofender e ameaçar a mulher de forma recorrente. As agressões incluíam xingamentos com termos homofóbicos, mesmo ela sendo heterossexual, e ameaças registradas em áudios e conversas em aplicativos de mensagem.
Para o relator, desembargador Eduardo Augusto Salomão Cambi, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, as ofensas extrapolam o âmbito individual e atingem também o coletivo, por se tratarem de manifestações preconceituosas que reforçam a marginalização de grupos LGBTQIA+. O magistrado comparou as ofensas à injúria racial e citou recente decisão do Supremo Tribunal Federal – STF neste sentido.
“O Judiciário tem papel essencial na promoção de uma cultura de respeito e igualdade ao reconhecer que a violência doméstica não se limita à agressão física, mas também abrange formas simbólicas e psicológicas de opressão, como as injúrias LGBTIfóbicas. Ao condenar tais condutas, como fizemos neste acórdão, o Judiciário afirma que a dignidade da pessoa humana é inviolável e que a orientação sexual ou identidade de gênero não pode ser usada como instrumento de humilhação ou controle”, comenta o magistrado, em entrevista ao IBDFAM.
A palavra da vítima
A decisão destaca ainda a relevância da palavra da vítima em casos de violência doméstica, e que os elementos apresentados – como boletins de ocorrência, mensagens e áudios – comprovaram os abusos. Por isso, foi fixada uma indenização que levou em conta a gravidade dos fatos e a condição financeira do agressor.
“A violência doméstica, especialmente a psicológica e moral, ocorre frequentemente na clandestinidade, sem testemunhas presenciais. Por isso, a palavra da vítima assume valor probatório diferenciado, sobretudo quando corroborada por outros elementos, como boletins de ocorrência, áudios, prints de mensagens e relatórios psicológicos – como foi o caso analisado”, analisa.
Segundo ele, o acórdão reconhece que a vulnerabilidade probatória da mulher exige uma abordagem “sensível e comprometida com a verdade substancial”.
Os desembargadores que analisaram o caso destacaram que a prática de violência psicológica contra a mulher, mesmo fora da convivência conjugal, dá direito à reparação por danos morais. O entendimento segue o Tema 983
Perspectiva de gênero
A decisão também cita a Lei Maria da Penha, a Constituição Federal, a Convenção de Belém do Pará e o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, entre outras convenções e atos normativos.
“O controle de convencionalidade é um instrumento indispensável para assegurar que as decisões judiciais estejam em conformidade com os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil. No caso em questão, a aplicação da Convenção de Belém do Pará, da CEDAW e dos Princípios de Yogyakarta reforça a obrigação de o Estado-Juiz proteger as mulheres contra todas as formas de violência, inclusive aquelas motivadas por orientação sexual”, comenta.
O desembargador argumenta que o Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ, por sua vez, oferece diretrizes concretas para que o julgador “reconheça e enfrente as assimetrias de poder nas relações familiares”. “Ele rompe com a falsa neutralidade do direito e promove uma justiça mais equitativa, que reconhece a historicidade da opressão de gênero e a necessidade de reparação integral das vítimas”, diz.
E acrescenta: “A aplicação do Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero permite que o julgador compreenda o contexto de desigualdade estrutural e valorize adequadamente os elementos subjetivos e indiciários, sem revitimizar a mulher ou exigir dela uma prova impossível”.
Para Eduardo Augusto Salomão Cambi, decisões fundamentadas em tais princípios “reforçam o compromisso do Judiciário com o constitucionalismo feminista multinível”. E completa: “Isso contribui para a desconstrução de estereótipos e para a efetivação de políticas de equidade, promovendo uma justiça mais inclusiva e sensível às vulnerabilidades sociais”.
Por Guilherme Gomes
Atendimento à imprensa: ascom@ibdfam.org.br